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Criando filhos para romper com o machismo

A nossa luta contra o machismo é diária e acontece em todos os lugares. Engana-se quem acha que está livre disso ao chegar em casa. Um dos nossos maiores desafios para ajudar a acabar com a cultura do machismo está na criação dos nossos filhos.

Quem é mãe sabe: criar filhos é uma tarefa difícil, trabalhosa, exige paciência e muita persistência. O que é mais fácil: colocar o prato de almoço do seu filho ou ensiná-lo a fazer isso, mesmo correndo o risco dele derramar tudo, sujar a toalha ou quebrar o prato nas primeiras vezes? Separar todos os dias a roupa que ele vai usar ou deixar que ele mesmo escolha, ainda que a combinação não seja tão bonita quanto a sua? Arrumar o quarto dele ou ensiná-lo a não bagunçar? As mães sabem o que é mais fácil, mas acontece que nem sempre escolher essa opção é a melhor maneira de oferecer uma boa criação.

Já ouvi algumas mães alegando que preferem fazer tudo para seus filhos (homens) porque eles são estabanados, desastrados, quebram tudo, derramam, sujam… então, para não ter o trabalho de consertar o estrago, preferem elas mesmas fazerem. Entendo que muitas vezes falta paciência mesmo, mas ensinar e repreender faz parte do ser mãe, não é verdade? Quem disse que seria fácil? Lidar com alguns pequenos prejuízos e erros faz parte do processo de aprendizado e nós não temos o direito de negar isso aos nossos filhos, independente do sexo. Eles precisam aprender a se virar, a não serem eternamente dependentes, porque é o futuro deles que está em jogo.

É importante entender que o machismo não está só no mundo lá fora, está dentro da nossa casa também, e é lá onde temos todas as possibilidades de reverter isso. O cara machão que não respeita mulher está diretamente relacionado à criança que não viu o pai respeitar a mãe; o homem que acha que a esposa deve ser uma serviçal do lar tem ligação direta com a criança mimada cuja mãe sempre deu tudo nas mãos; o cara que não sabe tomar decisões ou fazer escolhas por conta própria tem tudo a ver com a criança que nunca precisou fazer isso, pois a mãe sempre fez por ele; e por aí vai, os exemplos são infinitos. Daí a enorme responsabilidade que temos com os nossos filhos. Queremos que eles reproduzam o mundo cruel que encontramos lá fora ou queremos que eles sejam agentes de mudança?

Se não queremos ver os nossos filhos reproduzindo os comportamentos machistas que tanto nos oprimem, temos que começar a fazer a nossa lição de casa e quebrar alguns tabus, inclusive os aprendidos na nossa própria criação. Muitas de nós fomos criadas de uma forma completamente diferente dos nossos irmãos, mesmo estando na mesma casa e sendo filhos dos mesmos pais. Enquanto éramos ensinadas a fazer as tarefas domésticas, eles não podiam desempenhá-las porque não “levavam jeito”; enquanto nós éramos cobradas a ter uma postura mais adulta na infância (a famosa mocinha), a eles era permitido ser moleques e só se preocupar com as brincadeiras. Algumas de nós, inclusive, fomos cobradas a adotar uma postura de cuidadora dos nossos irmãos, mesmo sendo eles quase da mesma idade ou mais velhos. Com essa bagagem, a nossa tendência é reproduzir esse padrão de criação quando nos tornamos mães, portanto, precisamos ficar atentas.

Quando uma mãe trata o seu filho como um “reizinho”, cercando-o por todos os lados, dando tudo nas mãos e não deixando que ele tenha iniciativa e senso de responsabilidade, na verdade está preparando um marido passivo, omisso e egoísta, que vai transferir para a esposa tudo aquilo que ele acha que são as obrigações da mãe. E se a esposa também foi criada do mesmo jeito, o problema está completo, pois ela também vai achar que o marido deve tratá-la como “princesinha”. Porém, se ela teve uma criação diferente, dificilmente irá aceitar esse papel e os embates serão constantes. O resultado, em ambos os casos, será um casamento problemático. Deu pra entender o nível de responsabilidade? A criação que damos aos nossos filhos afeta diretamente a forma como eles irão agir na vida adulta e em seu próprio casamento. Afeta também a forma como se enxergam no mundo, a forma como enxergam os outros e, consequentemente, a felicidade deles.

Você cria seus filhos para servir ou para serem servidos? Será que, depois de adultos, eles vão saber andar sozinhos ou vão estar sempre à procura de alguém que os segure pela mão? E as suas filhas? Recebem a mesma criação superprotetora ou com elas você age diferente? Como você acha que pode contribuir para um mundo menos machista e mais justo com as mulheres apenas através da criação que dá aos seus filhos e filhas? São questões importantes que devem ser pensadas por quem é mãe e também por quem deseja ser.

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